terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

“Sou a cena viva onde passam vários actores representando várias peças.” Bernardo Soares

Eu

Eu sou a que no mundo anda perdida,
Eu sou a que na vida não tem norte,
Sou a irmã do Sonho, e desta sorte
Sou a crucificada… a dolorida…


Sombra de névoa ténue e esvaecida,
E que o destino amargo, triste e forte,
Impele brutalmente para a morte!
Alma de luto sempre incompreendida!…


Sou aquela que passa e ninguém vê…
Sou a que chamam triste sem o ser…
Sou a que chora sem saber porquê…


Sou talvez a visão que Alguém sonhou,
Alguém que veio ao mundo pra me ver
E que nunca na vida me encontrou!

Florbela Espanca - Livro de Mágoas



A fragilidade do Eu - a constante busca de algo que não se sabe, um tema constante ao longo do tempo...


Este poema reflecte a dor, a incompreensão que Florbela Espanca sofria e não percebia. Florbela apresenta-se como uma mulher desnorteada, sem rumo na vida, desejando a evasão e sendo ligada com a irrealidade. Nota-se aqui um sentimento de predestinação e o sentimento que a culpa da sua morte é do destino. No primeiro terceto destaca a falta de atenção, a descriminação, o estereótipo que sofria por toda a gente pensar que estava sempre triste, acabando por confessar não saber o porquê de muitas vezes chorar. Florbela muitas vezes nos seus poemas confessou que não se sabia definir porque ainda não se havia encontrado, provavelmente a sua tristeza sistemática muitas vezes tinha um significado que ela própria nem sabia.


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